Guerra no Oriente Médio e o Impacto nos Preços do Petróleo: Uma Análise Abrangente por Felipe Kury

Felipe Kury – Foto: Divulgação
Nas últimas semanas, o Oriente Médio se transformou em um cenário de tensões globais, com os ataques terroristas do Hamas a Israel desencadeando um conflito de grandes proporções. O impacto desse confronto, especialmente em relação aos preços do petróleo, agora ocupa o centro das atenções internacionais.
Embora qualquer guerra na região represente uma ameaça à segurança do abastecimento de petróleo, o envolvimento de um produtor da magnitude do Irã e/ou países do Golfo Pérsico pode ter implicações ainda mais profundas para o mercado global de energia. Atualmente, em virtude dos cortes na produção realizados pela OPEP+ para manter os preços do petróleo na faixa de US$ 80 a US$ 90, os principais produtores parecem, pelo menos por ora, mais preparados para resistir ao impacto, em comparação com crises anteriores.
A Arábia Saudita e aliados da OPEP+, após reduzirem a produção para sustentar os preços, agora possuem uma reserva técnica significativa de capacidade de produção de petróleo, a maior em mais de uma década, estimada em cerca de 4 milhões de barris por dia, representando aproximadamente 4% da oferta global, conforme dados da EIA (US Energy Information Administration).
Contudo, a escalada dos conflitos pode representar um risco substancial para o fornecimento de petróleo. A incerteza paira sobre a possibilidade de o Irã se envolver, considerando seu controle estratégico sobre o Estreito de Ormuz, por onde escoam diariamente cerca de 17 milhões de barris, representando 17% da demanda global. A guerra no Oriente Médio, concentrada até o momento em Israel, Faixa de Gaza e sul do Líbano, pode se expandir, impactando significativamente o mercado global de energia.
Adicionalmente, os EUA flexibilizaram as sanções ao setor energético da Venezuela, abrindo caminho para exportações adicionais de petróleo bruto pesado. Entretanto, os desafios de anos de subinvestimento e má gestão no país podem limitar o crescimento da produção a menos de 200 mil barris por dia até o final de 2024, demandando mais tempo e investimento para uma expansão significativa da oferta.
Diante desse contexto, o mercado global de petróleo permanece sob extrema pressão, agravada pelos conflitos no Oriente Médio. A Arábia Saudita é esperada para cumprir as quotas de produção reduzidas acordadas com a OPEP+ pelo menos até o final do primeiro trimestre de 2024. O patamar histórico de produção, estimado em 102 milhões de barris/dia em 2023, e o aumento previsto na demanda global de cerca de 1,3 milhões de barris/dia em 2024, intensificam a complexidade do cenário.
Enquanto o mundo já enfrentava uma crise energética decorrente da guerra Rússia-Ucrânia, desafios inflacionários e altos preços pós-pandemia, a guerra no Oriente Médio se configura como mais um elemento de tensão no mercado de energia. O Brasil, longe da região de conflito e ascendente como exportador de petróleo, destaca-se como uma nação resiliente, com vasto potencial para estar entre os cinco maiores produtores até 2030.
Apesar dessa perspectiva favorável no médio/longo prazo, no curto prazo, em caso de escalada nos conflitos, o Brasil, como importador líquido de derivados, pode enfrentar os impactos adversos de uma significativa elevação nos preços do petróleo. Diante deste panorama, urge a necessidade de um plano de contingência nacional para assegurar o abastecimento, mitigar os efeitos nas variações de preços e garantir a segurança energética. A pergunta crucial persiste: estamos preparados? O governo, agências reguladoras e a Petrobras precisam liderar essa iniciativa para fortalecer a resiliência do país diante dos desafios energéticos globais.
Felipe Kury é ex-diretor da ANP – Agência Nacional de Petróleo e Managing Partner na FK Energy Partners.