Ministério Público emite Recomendação ao município de Orocó quanto ao uso do “Kit Conselho Tutelar”

 Ministério Público emite Recomendação ao município de Orocó quanto ao uso do “Kit Conselho Tutelar”

O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL DE PERNAMBUCO, presentado pelo órgão de execução in fine, em atuação na 2ª Promotoria de Justiça de Cabrobó, em exercício cumulativo na Promotoria de Justiça de Orocó, no uso de suas atribuições constitucionais (arts. 127 e 129, III, VI e IX, da CF) e legais (arts.25, IV, a, e 26, I, ambos da Lei 8.625/93; art. 4º, IV, alínea a, da Lei Complementar Estadual 12/94 e art. 201, V, VI e VIII, da Lei 8.069/90), com esteio no artigo 27, parágrafo único, inciso IV , da Lei 8.625/93, no artigo 3º da Resolução n.164/2017 do Conselho Nacional do Ministério Público e no artigo 53 da Resolução n. 003/2019 do Conselho Superior do Ministério Público de Pernambuco, e ainda:

CONSIDERANDO que a Constituição Federal, em seu artigo 6º, reconhece como direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à infância e à maternidade e a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição;

CONSIDERANDO  que a Lei Fundamental, em seu artigo 227, estabelece como dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão;

CONSIDERANDO que o Estatuto da Criança e do Adolescente (art.131) erigiu o Conselho Tutelar à condição de órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, atendendo ao quanto disposto nos artigos 227, § 7º e 204, II, ambos da Norma Maior (exigência de participação democrática);

CONSIDERANDO que o Conselho Tutelar é fruto de intensa mobilização da sociedade brasileira no contexto de luta pelas liberdades democráticas, sendo o escopo principal de sua criação a consolidação do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente e a implementação das políticas públicas correlatas no plano municipal;

CONSIDERANDO que o Conselho Tutelar constitui peça essencial ao escorreito funcionamento do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente, porquanto sua regular atuação permite desjudicializar e agilizar o atendimento prestado à população infanto-juvenil;

CONSIDERANDO que, com o intuito de viabilizar o pleno exercício deste relevante mister, o legislador ordinário (art.134 do ECA) e o Conselho Nacional de Direitos da Criança (Resolução n. 170/2014) proclamam o dever legal dos municípios de prover o Conselho Tutelar com recursos materiais e humanos condizentes com a envergadura de suas funções;

CONSIDERANDO que, à luz destas premissas normativas, a Lei Orçamentária Municipal deverá estabelecer, preferencialmente, dotação específica para implantação, manutenção, funcionamento dos Conselhos Tutelares, bem como para o processo de escolha dos conselheiros tutelares, custeio com remuneração, formação continuada e execução de suas atividades;

CONSIDERANDO que a problemática da estruturação deficiente dos Conselhos Tutelares em expressivo número de municípios brasileiros despertou a atenção da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, a qual desenvolveu a ação nacional de “Equipagem dos Conselhos Tutelares” com o objetivo de “apoiar as prefeituras municipais nos processos de    qualificação da rede local, fortalecer os Conselhos Tutelares enquanto órgãos estratégicos do Sistema de Garantia de Direitos (SGD) e fomentar o acesso e o uso do Sistema de Informações para Infância e Adolescência (Sipia Web) junto aos conselheiros tutelares”;

CONSIDERANDO que o Município de Orocó/PE foi contemplado com “Kit Conselho Tutelar”, custeado por verba oriunda da União, através do qual foi fornecido ao Conselho Tutelar um veículo automotor, cinco computadores desktop, uma impressora multifuncional, um refrigerador e um bebedouro, para melhor desempenho de suas funções;

CONSIDERANDO que, segundo previsão expressa constante no termo de doação, os bens em questão deverão ser utilizados exclusivamente pelo Conselho Tutelar, podendo ensejar, em caso de desvio de uso do bem, a retratação da doação e a consequente restituição dos bens ao ente doador;

CONSIDERANDO que no Município de Orocó, consoante se apurou em visita pessoal, a impressora multifuncional e três dos computadores desktops integrantes do “Kit” não se encontram disponíveis, inexistindo ainda sistema de refrigeração de ar e mobiliário apropriado;

CONSIDERANDO que a omissão ou recusa da Municipalidade em prover o Conselho Tutelar do suporte material e humano necessário ao seu funcionamento enseja a propositura de ação judicial de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente;

CONSIDERANDO que ao Ministério Público compete promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e à adolescência, nos termos do artigo 127 da Constituição da República e do artigo 201, V, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

RESOLVE RECOMENDAR AO MUNICÍPIO DE OROCÓ que:

  1. Destine para uso exclusivo do Conselho Tutelar os bens integrantes do “Kit Conselho Tutelar” doado pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, sob pena de devolução destes à União;
  2. Abstenha-se, em consequência, de autorizar a utilização, a qualquer título, dos equipamentos supracitados por outras Secretarias ou órgãos do Município, ainda que transitoriamente;
  3. Determine, no prazo de 10 (dez) dias úteis, a devolução imediata de qualquer item do “Kit Conselho Tutelar” que estiver sendo utilizado, a qualquer título, por outras Secretarias ou órgão municipais, observado o item 7;
  4. Observe rigorosamente as demais exigências decorrentes do recebimento do “kit de equipagem” do Conselho Tutelar, notadamente implantação efetiva do Sistema de Informações para Infância e Adolescência (Sipia Web) e capacitação dos Conselheiros Tutelares;
  5. Assegure o fornecimento de combustível, a manutenção mecânica e demais meios necessários à continua utilização do veículo doado, sem prejuízo da instituição de mecanismos de controle assecuratórios de sua destinação para uso exclusivo do serviço;
  6. Disponibilize àquele órgão um motorista regularmente habilitado, com dedicação exclusiva, ou lotado em outra unidade da Administração Pública Municipal, desde que preste serviços em caráter prioritário junto ao Conselho Tutelar;
  7. Nos períodos em que o automóvel ou quaisquer bens afetados ao Conselho Tutelar estiverem em manutenção ou, por qualquer razão, não puderem ser utilizados, providencie, com a prioridade absoluta devida, que seja destinado àquele um veículo ou equipamento de reposição pelo tempo necessário à conclusão do reparo ou aquisição de novo bem, evitando assim solução de continuidade ao atendimento prestado pelo órgão;
  8. Providencie a instalação de sistema de refrigeração de ar na sede do Conselho Tutelar, bem assim diligencie a colocação de mobiliário apropriado, a instalação de serviço de internet e a manutenção de aparelho telefônico em perfeito estado de funcionamento, condizente com o desempenho do mister; a fim de assegurar um atendimento prioritário e adequado às crianças e adolescentes em um ambiente condigno e salubre, compatível com as condições climáticas locais.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO ADVERTE QUE a presente recomendação dá ciência e constitui em mora os destinatários quanto às providências solicitadas, podendo a omissão na adoção das medidas recomendadas implicar o manejo de todas as medidas administrativas e ações judiciais cabíveis contra os que se mantiverem inertes, inclusive com a responsabilização pessoal do Administrador Público, quando for o caso.

Oportunamente, notifique-se o Prefeito Municipal, para que tenha ciência da Recomendação e informe, no prazo de 10(dez) dias úteis, quais medidas serão adotadas pela Municipalidade para cumpri-la. Porventura o ente público repute inviável o atendimento imediato e integral da presente, deverá apresentar justificativa concreta e indicar cronograma pormenorizado que contemple a plena estruturação do Conselho Tutelar nos termos propostos, em prazo razoável, não superior a 120(cento e vinte) dias.

Na hipótese de alegação de impossibilidade de devolução de bem integrante do “Kit Conselho Tutelar” no prazo fixado, deverá ser declinado o motivo e apresentada a documentação comprobatória do alegado. Em qualquer caso, deverá haver a reposição do bem faltante, conforme os itens 3 e 7 da Recomendação.

Em tempo, encaminhe-se cópia desta Recomendação às rádios locais e blogs da região. Igualmente, envie-se cópia da presente ao Conselho Tutelar, ao Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente, ao Conselho Superior do Ministério Público, ao Centro de Apoio Operacional às Promotorias da Infância e Juventude, à Corregedoria Geral do Ministério Público e à Secretaria Geral do Ministério Público.

Orocó/PE, 03 de setembro de 2019.

Jamile Figueirôa Silveira
Promotora de Justiça

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